sexta-feira, 20 de junho de 2008

100 anos de imigração, 40 de aprendizado...


Minha avó materna, já falecida, nasceu em 1900. Chegou de navio ao Brasil, vinda do Japão, com a esperança de recomeçar a sua vida. Aprendeu a língua portuguesa pelo meio mais tradicional na época: "A Cartilha Caminho Suave". E conquistou a amizade, simpatia e admiração dos brasileiros ao seu redor.

Fui criado e educado por ela até os meus seis anos. Quem não tem boas lembranças das coisas da "vó"? O carinho, as receitas, as recomendações...puxa...que falta tudo isso faz nos dia de hoje. Ficou fixo na minha memória um episódio.

Já fazia cerca de três meses que não nos encontravámos. Decidi visitá-la num final de semana, logo após o almoço. Como de costume fui recebido com um sincero e forte sorriso, além de uma mão estendida. Nada das "italianadas" que pratico prazeirosamente em abundância com a minha família (beijos e abraços). Logo veio a pergunta, no melhor estilo nipônico, remixado com o tempero tropical: "você já comeu?" Respondi prontamente: "sim, obrigado!" Mesmo assim, com o intuito de tirar os três meses de "atraso", ela ligeiramente correu para a geladeira, com passos miúdos da típica oriental. Abriu a porta, reclinou-se na segunda prateleira e disparou: "tem feijón (feijão)...tem meron(melão)...tem chocorati (dispensa tecla SAP)...

Outra boa lembrança ocorreu no dia em que eu fui presenteado com um futon. Como toda criança que recebe um mimo personalizado, carregado de puro sentimento, fiquei eufórico. Me lembro que o tom era verde, com estampa típica do Japão. Abri o futon, olhei por alguns minutos e o dobrei novamente. Ela desdobrou tudo de novo e, cirurgicamente, alinhou ponta-com-ponta os quadrados da dobradura e, silenciosamente, colocou novamente no seu lugar.

Sinto saudades de aprender com o silêncio dos sábios, de receber a energia latente da ternura de quem te ama de verdade, sem cobranças, e das atitudes de pessoas que ensinam os descendentes a seguirem a vida com mais dignidade.